CASO MARIANA
A busca por reparação oito anos depois do desastre de Mariana – Quase 1 milhão de pessoas foram impactadas após colapso da barragem da Samarco. Moradores de vilas destruídas ainda esperam entrega de assentamentos.Impedidos de conviver com o rio Doce há oito anos, moradores do Quilombo 14, em Naque, Minas Gerais, esperam sair da invisibilidade. A pesca, o cultivo de alimentos e o lazer das cerca de 80 famílias estão em suspenso desde o colapso da barragem de Fundão, da mineradora Samarco, controlada pela Vale e BHP Billiton, em 5 de novembro de 2015.
Os mais de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos liberados no ambiente mataram imediatamente 19 pessoas, escorreram pelo rio Doce até encontrarem o Atlântico, na costa do Espírito Santo. É como se 1,3 milhão de contêineres marítimos cheios de lama fossem despejados numa avalanche.
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Agnaldo Batista Rodrigues, morador do quilombo, nunca mais plantou na ilha que o Doce formava perto da comunidade, a mais de 260 quilômetros do epicentro da tragédia. O cultivo de feijão, milho e hortaliças era vital para o consumo próprio das famílias e uma fonte de renda.
“Tivemos que começar a comprar comida. E ninguém mais quis comprar da gente. Nunca recebemos nada da Samarco por tudo o que perdemos”, diz Rodrigues à DW.
Foi só no fim de 2022 que ele e outras comunidades tradicionais atingidas passaram a contar com uma assessoria técnica independente. As entidades mapeiam os impactos e ajudam a apontar, após pesquisa, os danos que devem ser reparados.
“A gente ficou sem informação sobre nossos direitos todo este tempo. Agora a gente espera que a empresa faça o que é justo, que dê o mínimo do que a gente perdeu, que dê condições para a gente continuar na roça”, afirma Rodrigues.
Atingidos ficaram mais pobres
É possível que o número de pessoas atingidas ao longo das 49 cidades sob influência da rota de lama chegue a 980 mil, segundo estimativas baseadas em estudos da Fundação Getúlio Vargas. Em Naque, onde fica o Quilombo 14, um levantamento de dados inicial apontou a dificuldade de acesso à água e empobrecimento da população como consequências mais visíveis após o colapso da barragem.
“A postura das mineradoras é de não reconhecer sua responsabilidade sobre o rompimento e a necessidade de reparar danos decorrentes de um crime ambiental”, analisa
Franciene Vasconcelos, coordenadora institucional da Associação de Defesa Ambiental e Social, Aedas.
A entidade é uma das assessorias técnicas independentes nomeadas pela Justiça para ajudar moradores nas zonas impactadas. Uma coleta de dados preliminar com 1873 pessoas nos 15 municípios mineiros onde a Aedas atua mostrou que 75% nunca receberam qualquer auxílio financeiro emergencial. A cada 10 entrevistados, 9 empobreceram desde a tragédia socioambiental.
A missão de reparar os danos foi dada à Fundação Renova, criada em 2016 segundo um acordo entre Justiça e mineradoras. Embora a entidade afirme que tenha desembolsado R$ 32,66 bilhões em ações de reparação e compensação até agosto de 2023, a crítica de quem atua junto às comunidades é de que o atendimento está aquém das urgências.
“O que está sendo pago não garante o modo de vida dos atingidos. Não garante água para o plantio, por exemplo. A Renova diz que fica caro. Mas ela tem que arcar, porque o que as mineradoras fizeram ficou muito caro para as pessoas. Elas enterraram vidas, lembranças, história, enterraram tudo”, analisa Rodrigues Pires Vieira, da Caritas de Mariana, que presta assessoria técnica na região desde outubro de 2016.
Julgamento marcado na Inglaterra
No Brasil, ninguém foi preso como responsável pelo rompimento da barragem de rejeitos de Fundão oito anos após o desastre.
Na Inglaterra, a justiça marcou para agosto de 2024 o julgamento do processo que leva aos tribunais a mineradora anglo-australiana BHP. Recentemente, a Justiça aceitou a entrada da Vale na ação após pedi